terça-feira, 29 de maio de 2012

A gente se acostuma...


Marina Colasanti


Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.

(1972)



Marina Colasanti
nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna.




O texto acima foi extraído do livro "Eu sei, mas não devia", Editora Rocco - Rio de Janeiro, 1996, pág. 09.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência


FRASE DE 1920 ...
Frase da filósofa russo-americana Ayn Rand (judia, fugitiva da revolução russa, que chegou aos Estados Unidos na metade da década de 1920), mostrando uma visão com conhecimento de causa:

"Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui... para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você;quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em auto sacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada".

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Saudosismo

Estou com desejo de voltar à minha velha terra natal; tenho vontade de lá voltar e percorrer aquelas ruas e rememorar um outro tempo quando tudo era tão diferente, minha cidade era um mundo interminável, cada rua era como uma nova estrada que, por mais que nela eu andasse, sempre achava tudo imenso, as ruas eram quilométricas e cada percurso que fazia a pé era sempre uma nova façanha, na verdade nada foi tão espetacular, depois de muitos anos voltei lá e desconheci completamente aquele lugar; para começar, minha casa desapareceu, minha rua desapareceu, um bairro onde  eu andava livremente agora é um lugar visado pela polícia e os arranha-céus (nossa! arranha-céus !!!! agora fui fundo rs rs) bom, os predios tomaram conta de tudo, quero dizer, quase tudo, pois um resquício de identidade encontrei no meio de tanta metamorfose, o pinheiro, o meu pinheiro de natal, que vi meu pai comprar e levar para dentro da sala, depois de um tempo, ele plantou no quintal e, alguem, por  misericórdia, não o arrancou do chão, talvez por medo de alguma multa ou por achar que acabaria gastando dinheiro em vão; hoje este pinheiro stá com 8 metros de altura e a sua ponta aparece entre dois galpões; pelo menos, tenho esse consolo e a certeza que não havia entrado na cidade errada. Outro dia eu disse a um amigo que eu não tinha terra natal, que uma outra cidade me adotou, mas eu ainda tenho sonhos à noite com minha velha casa e meu quintal, sonho que mistura antigos e novos amigos todos dentro daquela mesma casa. Morar novamente nesta cidade está fora de cogitação, mas talvez eu não precise morar lá, pois esta cidade mora em mim!

terça-feira, 22 de maio de 2012

Esta música é uma das mais bonitas que já ouvi e deixo de brinde pra vocês!
First Circle

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Bendita realidade!


Eu já desejei não acordar de um belo sonho, talvez seja melhor eu me manter acordado e não deixar que o sonho me tire da realidade, estive pensando, o que é a realidade, é algo que vem pronta até nós ou é algo que nós mesmos forjamos e nomeamos? se assim for então estamos sonhando o tempo todo e a realidade não seja nada do que nos vemos; se é assim, vamos ver o que a realidade nos oferece; tudo que compõe a realidade é percebido pelos nossos sentidos, é o que nos dá a senssção de vida, de ar nos pulmões, de sol na cara, tudo que eu pego, ouçco e vejo. E os sonhos? quase sempre nos dão poderes maravilhosos, ganhamos velocidade, alcançcamos uma torre e logo chegamos à beira de um rio, enfrentamos perigos e passamos por lugares onde nunca estivemos, mas nunca vemos o fim de uma história, pois a luz do sol entra pela janela ou um despertador me chama de volta para a realidade; para ser franco, já desejei que os meus sonhos não fossem tão "reais" , já acordei dando graças a Deus por escapar da perseguição de cães bravos, era cinco da manhã e eu estava feliz por ter escapado do pior. Bendita realidade! Não posso viver sem voce! Ó doce vida, nunca mais reclamarei de voce! eu quero tudo ao vivo e a cores, de preferência, com inicio, meio e fim, como é cada dia que surge e como cada noite que chega, bem devagar, como uma sinfonia que vai anunciando os novos atos da nossa história. O que nos reserva amanhã? Deixa em suspense! Meu sonho seja então que amanhã seja tão lindo quanto hoje, lindo enquanto eu vivo!

a solução tão perto

Quando as coisas ficam dificeis e parece que um grande nó se forma em nossa mente, e não conseguimos sair do lugar, quem já não passou por isso. Eu já lutei para encontrar algo que estava no alcance da minha mão, é uma sensação estranha, me perguntei porque eu tive que me sacrificar tanto. Não digo todas as coisas mas via de regra, por causa da nossa ansiedade perdemos contato com aquilo que precisamos e a unica forma de desvencilharmos dessa armadilha, é desconfiarmos dessa nossa correria, pararmos um pouco, procurar nos localizar no tempo e no espaço, possivelmente o maior efeito causado pela ansiedade; isso vale para uma peça de roupa que não sabemos onde colocamos mas pode também ser alguma coisa extremamante importante, não necessariamente algo fisico, mas que nos levará através da  nossa volta aos eixos, vamos encontrar belas respostas de forma mais breve. Então, pare de pensar que só voce se esquece onde está o que voce esta procurando, agora mesmo, alguma coisa ou alguém está bem perto de voce, alguma coisa ou alguém que dará alegrias a voce, só precisa ser percebido dessa maneira mais simples, ou seja, parando um pouco para saber onde estamos no meio dessa correria toda.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Quem voce pensa que é?

Quem eu penso que sou?Outro dia, já faz uns 30 anos, alguém me fez esta pergunta. Não gostei, me doeu a alma. Ahh memórias!! Quanto progresso existe hoje em dia para poder melhorar nossa memória, mas não duvido que alguém proponha uma vacina, ou um transplante ou mesmo um chip implantado para que todas as péssimas memórias sejam apagadas, assim não precisaríamos ficar desconfortados e ter de refletir sobre elas, mas isso seria ao mesmo tempo a maior das burrices, pois é com perguntas assim que nós nos sacudimos e reencontramos nosso eu perdido entre a multidão dos que já se esqueceram ou mesmo dos que nunca se souberam. Quem eu penso que sou? Sou alguém que espera respeito, sou alguém que se ama profundamente, sou alguém com um imenso patrimônio interior, sou alguém que não apenas vivo, mas amo viver e, para você retorno esta provocante pergunta e também e pergunto por que quer saber, uma vez que sua vida não depende de mim. Penso que sou o máximo, o máximo dos meus limites, o máximo dos meus sonhos, o máximo do que eu acredito; eu sou tudo que você também é, acredite! Especiais, inclonáveis e maravilhosamente finitos.

procurando o que não se sabe que perdeu!


Outro dia queria tanto encontrar um documento que há  muito eu fiz pouco caso por realmente achar que não me serviria para nada, até que meu irmão me disse algo que me estimulou a ver com atenção aquele documento para saber do que se  tratava. Comecei revirando todas as minhas pastas com a minha conhecida organização desorganizada, e uma, duas , três vezes e... nada. Eu e minha  manias de achar que tudo tem uma lição filosófica e lá vou eu mais uma vez. Queria mesmo que tudo na minha vida eu pudesse rever, ainda que por algum momento eu fizesse  até pouco caso, pois eu tenho aprendido que muitas coisas que antes eu achava assunto terciário, hoje eu me interesso de saber daquelas coisas mais simples, como esse caso que contei no ultimo post. Quanto ao documento eu achei e estava ali debaixo do meu nariz, eu li e vi que de fato era um documento sem valor para mim, mas muitas vezes faz bem saber  que algumas coisa podem ficar no rabo da fila enquanto tem coisas aparentemente sem importância e que estão o tempo todo diante de nós, só esperando um olhar atento. Parafraseando arrogantemente Jesus Cristo, eu tenho motivos para saltar de alegria a cada simples descoberta, pois hoje a simplicidade é um artigo de luxo, e eu adoro luxo! Quem descobre a simplicidade, descobre uma riqueza imensurável, esse é meu comentário de  hoje!

quarta-feira, 2 de maio de 2012

um riso inusitado


Depois de uma longa espera, doze anos às voltas com o inventario de bens, dos quais todos os filhos abriram mão de partilha, Dona consegue reunir seus filhos e noras e um genro, para assinar papeis num cartório. Depois de tanta espera e reconhecidamente, depois de toda paciência  e perseverança daquela matriarca, ali estavam todos aliviados mas ainda tensos pois o ambiente de um cartório é sempre de tensão, investigação, desapontamentos e/ou dissabores, fora o ar carrancudo do tabelião que a todo custo impõe a seriedade do seu trabalho. Numa pequena sala la estavam todos os convocados se espremendo; lá estava também o comprador do imóvel pronto para efetuar o pagamento após também longa espera pela liberação do imóvel, pela mesma razão: a burocracia cartorial.



Repentinamente o comprador começou a contar algumas histórias sobre sua atividade de trabalho; talvez não tivesse a intenção de quebrar o gelo mas, de pouco a pouco, foi aumentando a graça de tudo a quilo que ele falava e isso foi contagiando um e outro e de repente houve uma série de frases puramente hilariantes e não foi possível segurar o riso, em poucos momentos quase todos se despencaram em gargalhadas fora uns poucos que se mantinham, como assim dizer, comportados. Um dos filhos prendia visivelmente o riso pois não tinha a liberdade de ir em publico, perdeu um ótima chance de se soltar; enfim, estavam todos numa risadaria   contagiante.



Com as divisórias daquela sala eram em vidro dava para se perceber em volta os olhares espantados e estapafúrdicos dos de fora, afinal, rir naquele lugar era como um sacrilégio, como sentir prazer e contentamento num oratório da justiça, num espaço tão carregado de seriedade; ah sim, diga-se de passagem, o tabelião foi um herói, se segurou bem, o melhor de tudo é que ele não se comportou como um sacerdote surtado, pedindo silêncio ou respeito.



Ah com são preciosos estes momentos, de rir um pouco da própria  vida; como foi foi aquele momento; em que a grande homenageada estava feliz e ainda não satisfeita, preparou uma surpresa que nada tinha a ver com papeis; após tudo se concretizar, ela retiruo de sua bolsa um recipiente com... pastéis de forno com recheio de frango, do jeito que ela fazia quando aqueles filhos eram crianças, aqueles pastéis que ela fazia para os passeios ou piqueniques; não faltou a foto para registrar, tudo isso aconteceu esta semana, dia 30 de abril na cidade de Itaboraí. Obrigado Dona Zelithy, minha querida mãe, por você existir.